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A toponímia quilombola dos municípios de Arcos, Pains e Formiga

O famoso Quilombo do Campo Grande, confederação quilombola cuja capital foi a Primeira Povoação do Ambrósio, que por ocasião da Guerra Quilombola de 1746 se localizava a norte do atual município de Cristais-MG, tinha então os seus quilombos confederados esparramados por todo o Centro-Oeste de Minas Gerais, abrangendo os territórios dos atuais municípios de Aguanil, Cristais, Guapé, Piumhi, Formiga, Pains e Arcos.

Essa confederação quilombola abrigava NAO SÓ a escravos fugidos, MAS TAMBÉM a pretos forros com seus escravos e brancos pobres também com seus escravos, TODOS eles fugidos do Sistema Tributário da Capitação, o imposto mais cruel e sanguinário que se viu nas Minas Gerais, causa direta do maior genocídio da América do Sul (somadas as mortandades das Guerras Quilombolas de 1746 e de 1759/60).

O Governador Gomes Freire de Andrada NÃO conseguiu derrotar e nem destruir o Primeiro Quilombo do Ambrósio em 1746. O Rei Ambrósio continuou VIVO e a liderar os quilombolas, transferindo sua capital para a região entre as atuais cidades de Campos Altos e Ibiá, então na Comarca (depois Capitania) de Goiás, hoje, Minas Gerais, multiplicando seus quilombos confederados na região dos atuais Alto Paranaíba, Triângulo e Sudoeste de Minas.

A Confederação Quilombola do Campo Grande resistiu bravamente até 1759-1760 quando, finalmente, foi destruída pelas tropas de Gomes Freire, sendo que o Rei Ambrósio pereceu provavelmente em 7 de setembro de 1759 na batalha do Quilombo da Pernaíba (quilombo localizado à nordeste da atual cidade de Patrocínio), onde vendeu caro a sua vida em troca da liberdade, da dignidade e da honra do Povo Negro.

Por que quase ninguém conhecia estes detalhes da História do Rei Ambrósio?

Logo após o ano de 1760, Gomes Freire contratou o grande mentiroso Inácio Correia Pamplona (também um dos maiores traidores da Inconfidência Mineira) para fabricar mentiras de maneira a deixar para a História que o Campo Grande teria sido derrotado em 1746, quando o Rei Ambrósio teria sido morto.

Pamplona, também por ordem de Gomes Freire e de seus sucessores (Luís Diogo e Valadares), espalhou a falsa notícia de que o Quilombo do Ambrósio não só teria sido destruído em 1746, mas que esse fato teria ocorrido noutro lugar, ou seja, na região limítrofe às atuais cidades mineiras de Campos Altos e Ibiá.

O atual Triângulo Mineiro, até 1816, NUNCA fora mineiro e sim GOIANO. Foi à custa das mentiras de Inácio Correia Pamplona e de seus capachos, vereadores da Câmara de Tamanduá (hoje Itapecerica) e de São João Del Rei que os reinóis mineiros conseguiram ESBULHAR o Triângulo Goiano e torná-lo Mineiro. A Revista do Arquivo Público Mineiro, sem qualquer estudo ou crítica, publicou entre 1895 e 1904, matérias de fidedignidade duvidosa e até falsas, tentando justificar esse esbulho, onde se destaca a famosa Carta da Câmara de Tamanduá à Rainha, em 1793, monumento à mentira, erigido provavelmente a mando de Inácio Correia Pamplona.

Tudo isto levou gerações de historiadores a erro, a exemplo de Hildebrando Pontes, Waldemar de Almeida Barbosa e muitos outros, mantendo sepultada e mutilada a gloriosa História do Quilombo do Campo Grande que, assim, ficou reduzida a um quilombinho só, o Quilombo do Ambrósio de Ibiá, destruído e derrotado em 1746, quando, segundo os ladrões da história, o seu Rei – covarde, segundo eles – teria sido morto.

Hoje, depois de quase trinta anos de pesquisa documental, coseguimos desenterrar dos arquivos públicos boa parte da gloriosa História do Quilombo do Campo Grande. Esses documentos, no entanto, só puderam ser interpretados com segurança porque foram concatenados com os topônimos quilombolas que, como se fossem gritos desesperados, se perpetuaram no tempo, marcando até hoje muitos dos espaços onde o sangue negro foi derramado em encarniçadas lutas, primeiro contra a opressão tributária (até 1750) e, depois (1751-1760), contra o sistema escravista que só seria extinto em 1888.

Os mapas de Arcos, Pains e Formiga, mais parecem um mapa de Angola. Toponímias africanas antigas, requícios da luta de 1746, quando entrincheirados na região do Morro das Balas os quilombolas de Arcos, Pains e Formiga interceptaram as tropas que pretendiam atacar a Primeira Povoação do Ambrósio. Confirmamos essas toponímias no livro de Registro de Terras de 1856 (APM), de onde destacamos os seguintes topônimos:

1 –Candonga e Candonguinha, ribeirão e fazendas com esse nome confirmam a antiguidade desse topônimo em Arcos, que significa falsidade, manha, lisonja ou intimidade carinhosa entre amantes.

2 – Cazanga, também em Arcos, caverna e local com esse nome que também era o apelido do alferes Pedro José de Almeida, que ainda hoje é sobrenome de pessoas, nome de uma lagoa e de uma ilha, ambas situadas a norte de Luanda, em Angola.

3 – Marco de Pedra e Muro de Pedra que, atualmente, pode ter sido destruído pelas mineradoras de Arcos.

4 – Fazenda Quilombinho, a norte de Pains, nascentes do rio São Miguel abaixo, já em Arcos, passando pela Ponte de Pedra até a Bocaina.

5 – Quilombo do Barbeiro e Quilombo do Rabelo, mencionados no processo de justificação de Inácio Correia Pamplona em 1804.  A fazenda Quilombinho está contida dentro do mesmo, que abrange enorme extensão de terras, indicando vertentes do córrego de Santo Antônio e do rio São Miguel, abrangendo o conjunto toponímico indicado pelos mapas de 1939 com os nomes de Bocaina, Ponte de Terra, Quilombo, Fazenda Corumbá, Muro de Pedra e Serra do Ambrósio, numa diagonal de norte a sudeste de Pains já adentrando o território de Arcos. Nesse município, a região entre o Santo Antônio e São Miguel fecha o território denominado quilombo em Calciolândia, córrego da Candonga e Fazenda Cazanga.

6 – Serra do Ambrósio – esse topônimo é apresentado em vários registros de terras de 1856 apenas como “Serra” e “Serra Mestra” sem o complemento “do Ambrósio” registrado nos mapas de Arcos e Formiga do ano de 1939.

7 – Na divisa de Arcos com Formiga temos o território denominado Luanda que, assim como o de Cazanga, se inserem à geografia de Angola, onde esse último é uma ilha que fica a noroeste da capital Luanda.

8 – Quilombo, enorme território dentro do atual município de Formiga, abrangendo desde as nascentes do córrego da Areia até as vertentes do córrego da Formiga. Sendo que o topônimo Fazenda do Quilombo fica na margem direita do córrego do Quilombo e o LUGAR com o nome de Quilombo a nordeste de Formiga, nas nascentes desse córrego e contíguo ao Morro das Balas. O primeiro dono dessa Sesmaria do Quilombo, Antônio José da Silva, mediu as suas três léguas em quadra, dando-lhe como centro da propriedade o alto do córrego da Areia. Todo o território de ambas as margens do córrego do Quilombo até a sua barra no rio Formiga sempre foi chamado de Quilombo, mesmo tendo sido fatiado em dezenas de pequenas propriedades, sendo o maior proprietário o Padre Doutor, primeiro capelão ou pároco de Formiga, advogado e juiz de sesmarias que, aliás, demarcou, entre outras as sesmarias de Candeias e a do Quilombo do Ambrósio, em território da atual Cristais.

9 –  Morro das Balas em Formiga, tombado pelo  Decreto nº 5.682 de 20 de novembro de 2012, fica dentro da Sesmaria do Quilombo. Situado ao norte contíguo às nascentes do córrego do Quilombo, onde realmente está o local de nome Quilombo. A estrada que passa por ele é mesmo muito antiga, indicada no roteiro de Pamplona (1769), sendo uma variante ou a própria picada do Campo Grande rumo a Goiás, incrementada em 1737 a mando de Gomes Freire de Andrada.

Confira na sequência o levantamento dessa toponímia quilombola de Arcos, Pains e Formiga, contendo os nomes de seus proprietários, extensão e localização no ano de 1856 em  Planilha PDF.

Tarcísio José Martins, para MGQUILOMBO, em 15.10.2013.