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Quilombo das Goiabeiras

Visitei Ibiraci-MG a 9 e 10 de junho de 2007, quando o pesquisador José Limonti Júnior, por entender mais correta a tese de nossa primeira edição, nos enfatizou vários documentos onde se destaca o local da posse eclesiástica do Desemboque (Ibiraci), tomada pelo pe. dr. Marcos Freire de Carvalho em 24 de setembro de 1761: “… nas margens dele (rio Grande) da parte do poente, fronteira ao sol, que nasce das Gerais, junto da picada, que fizeram as companhias militares, que vieram conquistar os negros do dito Sertão (do rio Grande) e do Campo Grande[1].

Realmente, o roteiro da tropa de Bartolomeu Bueno (mapa do capitão França) não pode ser confundido com o roteiro da expedição do governador Luiz Diogo Lobo da Silva. As tropas de Bartolomeu, como é confirmado no documento acima, passaram mesmo pelos locais indicados em nossa primeira edição.

Achar os resquícios de um rego d’água feito há quase duzentos e cinqüenta anos atrás, mesmo tendo ele mais de seis quilômetros, é tarefa dificílima em região que conhece o arado com trator há pelo menos quarenta anos. Outro ponto a considerar, seria seu vetor com queda de nível, de sul para nordeste, visto que sua razão seria levar água para o quilombo de mineradores.
Encontramos através do Google Earth resquícios não de um, mas de dois pares de regos dágua[2], que numa sequência quebrada por um corgo, mantêm o rumo sul-nordeste, desaguando num lugar cheio de sinais que poderiam indicar antiga lavra. Este sítio, entre Ibiraci e Cássia, fica ao norte de Capetinga, com ponteiro central às coordenadas 20º33’25.57”s e 47º03’36.73”w, colhidas no Google Earth.
Visitamos o local em companhia dos colegas Júlio Pereira e Limonti Júnior, além dos amigos Jacinto Honório Silva e Rui de Lima, também moradores de Ibiraci.
Quanto ao primeiro par de regos, margem direita da estrada que vai de Ibiraci para Cássia, de 806 metros de comprimento: a) o rego mais novo fora recentemente entupido, havendo até uma barreira intermediária de sacos de areia para que as águas não o abrissem novamente; b) o rego antigo continuava lá; as marcas da sua parte entupida podem ser vistas no Google Earth. A parte ainda existente, constitui hoje uma imensa boçoroca[3], de mais de 450 metros de comprimento por 10 a 20 de profundidade, tendo ao final, um lago represado, com um cano de plástico[4] que libera suas águas em bica rumo ao córrego que sua antiquíssima construção visou alimentar.
Ao final de ambos os regos, as marcas de garimpagem são evidentíssimas nas pedras amontoadas. Limonti Júnior confirmou com a tradição dos moradores do local que ali sempre foi lavra de diamantes.
Quanto ao segundo par de regos de 930 metros que sugariam água do córrego alimentado pelos primeiros, encontramos uma dupla ala de paineiras onde, ao final, a da direita se abre[5]. Há no interior das alas, muitas pedras soltas que poderiam indicar a existência antiga de um rego que teria sido entupido e, as paineiras, de terem servido para corrigir, prevenir ou impedir a erosão.
O local nominado como Quilombo no mapa da Divisão Definitiva, de Otto Bendix, 1937, é apontado exatamente num círculo onde se concentram as nascentes dos córregos da Alegria, São Tomé, dos Bois, Campeiro e Cascavel, sendo, este último, afluente do rio São Pedro que deságua no Jacuí. Todo o vale a leste deste provável par de regos apresenta sinais de desmonte de barrancos e toda aquela marafunda típica dos locais onde existiram lavras de ouro e de diamante[6]. Outra conotação entre o mapa do capitão França e a posse eclesiástica do pe. Marcos Freire de 1761 é que estavam no Desemboque (Ibiraci), junto da picada por onde Bartolomeu viera destruir os quilombos. O capitão França deu a esse quilombo o nome de Goiabeiras, ao sul do Desemboque. O neto de Bartolomeu e suas testemunhas não citam esse quilombo, mas citam o Quilombo do Desemboque que, portanto, só pode ser este Goiabeiras do mapa de França.
O mapa de França aponta a existência de 90 casas para o Goiabeiras, o que, considerado o número de seis habitantes por casa, daria uma população 540 pessoas.

Veja imagens do local. Trecho retirado do livro Quilombo do Campo Grande – A História de Minas que se devolve ao povo.
Todos os direitos reservados a Tarcísio José Martins.


[1] Documentos Interessantes – SP, p. 66.

[2] Com sinais de serem, em cada par, um rego novo e um antigo.
[3] Marcas da erosão rasgada na terra pela água.
[4] Ponteiro Google Earth assinalado às coordenadas 20º33’17.56”s e 47º03’43.81”w.
[5] Quadro, cujo ponteiro central fica às coordenadas 20º33’05.36”s e 47º02’58.83”w.
[6] Ponteiro Google Earth assinalado às coordenadas 20º33’08.73”s e 47º02’29.25”w.